Entre o rio Douro e o rio Vouga ficam quatro belas serras: a da Freita, a da Arada, a do Arestal e a de Montemuro. Pelas lendas que se contam e pelo seu misticismo, são hoje conhecidas como as Montanhas Mágicas (leiam o segundo artigo aqui). Compreendem uma área superior a 1600km2 e por aqui vivem mais de 120.000 habitantes. Se nunca ouviram falar nelas, não se preocupem. Eu também não as conhecia, mas num destes fins-de-semana de inverno rumei ao norte e embrenhei-me nas montanhas, especialmente na Serra de Montemuro. Não encontrei duendes nem outras criaturas mágicas, mas sim um belo património natural com vales a desbravar!
Com uma altura média de 838 metros, o ponto mais alto é em Talegre, a 1381 metros. Bastante íngreme e com um bom punhado de aldeias polvilhadas pelo território, esta é conhecida por ser a “mais desconhecida das serras”. Vamos lá conhecê-la?
A chegar à Serra de Montemuro: Os Passadiços do Paiva
No primeiro dia de passeio, acordámos cedo, fugimos às nuvens que nos envolviam e fomos em busca do ex libris da região: os Passadiços do Paiva. São 8 quilómetros de pura beleza natural onde vamos apreciando (e sentindo nas pernas) a profundidade do vale e o intrincado desenho que a montanha esculpiu. O percurso estende-se da praia fluvial do Areinho à praia fluvial de Espiunca, mas pelo meio existem vários pontos de paragem obrigatória. Depois do nevoeiro inicial, que tardou em se dissipar, pudemos finalmente observar os dois pontos principais: a Cascata das Aguieiras, que se ergue a 160 metros, e a Garganta do Paiva, onde a água não teve força para erodir o granito e corre mais estreita, formando um canal.
Nota: Os Passadiços do Paiva estão localizados no concelho de Arouca. Estão abertos todos os dias da semana, das 8h00 às 20h00 de abril a setembro e das 9h00 às 17h00 de outubro a março. A entrada custa 2 euros no local ou 1 euro se for comprada antecipadamente aqui. Em época alta, o custo duplica para 4 euros e 2 euros, respetivamente.
Aldeias de Montemuro: Gralheira e Bustelo da Laje
Da parte da tarde, fomos visitar duas aldeias serranas. Em plena serra de Montemuro, Gralheira é a mais alta da região. Com casas de granito, paredes largas e telhados de colmo, esta é uma terra de gente rija e sem papos na língua. Logo à entrada encontrámos uma aldeã que conseguiu, ao mesmo tempo, insultar e abraçar os espanhóis que por ali andavam em passeio. Ríspida nas palavras, mas terna no coração e de sorriso fácil, acaba por se afastar a cantar: “São caracóis, são caracolitos. São os espanhóis, são espanholitos.” Tenho cá para mim que, se a Amália Rodrigues a ouvisse, iria gostar da forma como esta senhora espanta os desgostos.
Mas não só de gente castiça se faz esta aldeia. Por altura da quadra natalícia, a Gralheira transforma-se na Aldeia do Pai Natal e a povoação estava em festa, com uma grande fogueira ao ar livre para receber os visitantes. Havia uma pequena feira de artesanato e gastronomia e, até, um comboio turístico. Na Casa do Ribeirinho cozia-se pão com chouriço no forno a lenha, que se partilhava com a gente da terra.
Ainda na serra de Montemuro, na encosta este do vale de Bestança, encontrámos na aldeia de Bustelo da Laje, o local ideal para assistir ao pôr-do-sol: uma eira formada por uma única laje de granito, de grandes dimensões. É sentar-nos e apreciar a vista ampla para a serra. Isolada e pitoresca, este é um dos locais em Portugal onde ainda subsiste um espírito comunitário, em que as tarefas agrícolas são partilhadas.
As águas límpidas do rio Bestança
Chegámos já de noite ao cais do Porto Antigo, e mergulhámos no silêncio que a noite nos trouxe. Neste ponto onde o rio Douro se une ao rio Bestança, partem inúmeras embarcações durante o dia, mas à noite as águas emanam uma calma que nos deixa repousar e apreciar no breu o belíssimo vale que nos rodeia.
Pela manhã, recuperadas as energias, partimos em busca do vale do rio Bestança, aquele é considerado um dos rios menos poluídos da Europa. São apenas 15 quilómetros de curso de água, mas o vale que o rodeia faz-nos suster o fôlego, principalmente com as cores douradas do outono. Existem 6 percursos pedestres assinalados, para quem goste de dar à sola e queira conhecer esta bela região.
Lá perto, nós fizemos um percurso junto ao rio Douro que nos levou à cascata da ribeiro de Sampaio. O percurso é de muito fácil acesso e é recomendado para quem não conheça a região. Basta parar o carro junto ao Parque de Lazer do Ribeiro de Sampaio (que tem uma zona de merendas) e subir o rio pelo percurso assinalado. Em 10 minutos a pé, encontrarão a queda de água!
Castelo de Paiva e a sua Ilha dos Amores
Teimosamente localizada na confluência do rio Paiva e do rio Douro, a ilha dos Amores herdou o nome da história de amor trágica entre uma fidalga e um lavrador. Depois de o lavrador ter assassinado o noivo da sua pretendente, exilou-se na ilha para que não fosse levado à justiça. Em desespero, voltou a solo firme para se declarar à fidalga e convidá-la a vir viver consigo na ilha, contudo, quando ambos atravessavam o rio numa embarcação, de regresso à ilha, formou-se uma tempestade e os dois nunca chegaram ao seu destino.
Hoje, a ilha é bem mais acessível e visitada principalmente no verão, onde há pequenas embarcações que fazem a travessia e é instalada uma piscina ao ar livre com um bar na praia fluvial. Quem visita a ilhota, consegue ver do topo três concelhos: Castelo de Paiva, Marco de Canaveses e Cinfães. Além da pequena zona de merendas, encontra-se aqui as ruínas da Ermida de São Pedro, do século XV.
A visita à Serra de Montemuro não ficaria terminada sem uma ida a Castelo de Paiva. Conhecida pelo vinho verde e pela lampreia, encontrámos uma feira de artesanato e gastronomia no Largo do Conde, a praça principal da vila. Logo ali ao lado, visitámos ainda a Casa de Payva, com diversos produtos de origem local. No dia em que visitámos, os vinhos estavam em destaque e pudemos provar várias produções locais, que muito dificilmente encontramos fora da região. É o caso dos vinhos da Casa de Algar, onde fazem também provas de vinho e é possível participar nas vindimas.
Outros pontos de interesse na Serra de Montemuro
Apesar de eu não ter visitado, fiquei com bastante curiosidade de conhecer outros pontos da serra de Montemuro. Caso tenham interesse em visitá-los, basta clicarem nos links e, depois, em Como Chegar. Além da localização exata para quem vai de carro, estão assinalados os pontos que fazem parte de Percursos Pedestres de Pequena Rota (PR). Depois, basta encontrar no Google o folheto do percursos ou dirigirem-se ao centro de turismo da região antes da caminhada.
- Portas de Montemuro: Este é um ótimo ponto de partida para visitar a serra. A sul, vemos as encostas do vale do Paiva e avistamos a serra da Estrela, a serra do Caramulo e o maciço da Gralheira. A norte, vislumbramos o vale do Bestança.
- Cascata da Tojosa: Percorrendo as encostas de Montemuro, a ribeira Eiriz cria várias quedas de água no seu percurso e esta é talvez a mais bela.
- Minas de Moimenta: As ruínas desta exploração mineira fazem as delícias de quem gosta de desvendar locais abandonados e grutas.
- Carreira de Moinhos de Alvarenga: Conta a lenda do Rego do Boi, que a astúcia dos alvarenguenses levou a melhor à população da Nespereira. Do dia para a noite, construíram um moinho e desviaram o curso do rio Ardena, garantindo aos seus habitantes direitos sobre o curso de água. Para celebrar, os alvarenguenses comeram um boi inteiro! Ao longo dos anos, foram construídos 22 moinhos, sendo que apenas 2 se encontram hoje em funcionamento.
- Ponte de Covelas: Esta bela ponte sobre o rio Bestança data do século XVIII e era um importante ponto de passagem entre Tendais e o Porto Antigo. Lá perto, desagua a ribeira de Enxidrô, formando uma bela cascata que vale a pena visitar!
- Pico do Talegre: Este é o ponto mais alto da serra de Montemuro e de todas as Montanhas Mágicas, com uma altitude de 1381 metros. Num dia límpido, conseguimos avistar tanto a serra do Gerês, como a serra da Estrela.
- Cascata da ribeira de Tendais: Perto de Aveloso, existem várias quedas de água, que dão uma beleza única ao vale. Existe também um conjunto de 40 moinhos junto às levadas.
Onde Comer na região da Serra de Montemuro
Restaurante O Recanto dos Carvalhos, Gralheira
Quando se entra numa aldeia remota na serra e se encontra um restaurante apinhado de gente que fez dezenas de quilómetros para ali estar, a coisa só pode correr bem. Foi assim n’O Recanto dos Carvalhos. A rebentar de calor humano, este é um restaurante típico do norte, e não podia fazer um elogio mais positivo!
– A Refeição
Só pela comida vale a pena visitar a Gralheira. E começámos pelo melhor: as entradas. Toda a refeição podia ficar por aqui: desde o pão recheado de enchidos, acabado de sair do forno, aos enchidos assados (chouriço, alheira), ao queijo da serra e ao melão com presunto. Tudo uma delícia. E, para finalizar, a especialidade da casa que deu fama ao restaurante: a pizza serrana, feita em forno a lenha.
Depois das entradas, virem os pratos principais. As especialidades são o cabrito assado, a posta à recanto e a vitela no forno. Nós, optámos por um cozido à portuguesa, recheado das melhores carnes da região. Para terminar, algo para adoçar o palato: o doce à casa que, desta feita, era feito com bolacha e leite condensado. Rendida!
– Preços e Reservas
O preço médio de uma refeição completa n’O Recanto dos Carvalhos é 20 euros. Dada a grande afluência do restaurante, convém reservar mesa. Poderão fazê-lo através do +351 255 571 566 ou no formulário de contacto aqui. Está aberto ao almoço e jantar das 12h00 às 2h00, todos os dias da semana.
– Localização
O Recanto dos Carvalhos fica localizado na Rua do Carvalho 1, à entrada da aldeia da Gralheira, concelho de Cinfães.
Restaurante D. Amélia, Castelo de Paiva
Num espaço recatado com vista para o vale do Douro, fica o restaurante D. Amélia. A decoração é simples, ideal para uma refeição descontraída entre amigos ou família. Por aqui pode-se degustar o melhor da região, incluindo o bom vinho verde tinto que por aqui há.
– A Refeição
À nossa espera, tínhamos pastéis de bacalhau quentinhos e presunto da região. Começámos bem, mas fomos para ainda melhor. Se o cabrito no forno com batata e arroz fez as delícias da maioria, o polvo com batata a murro e ovo cozido estava absolutamente divinal e muito leve.
Contudo, o melhor estava guardado para o fim. A fama do pão-de-ló que é servido no D. Amélia faz quilómetros e eu descobri que por muito boas razões. Extremamente doce e fofo, vem no ponto do mal-cozido. Comi, pelo menos, 4 fatias e fiquei cheia de vontade de trazer um bolo inteiro para casa. Descobri, mais tarde, que este é o melhor pão-de-ló do universo e que pode ser adquirido em vários pontos do país, incluindo em Lisboa.
– Preços e Reservas
O preço médio de uma refeição completa no restaurante D. Amélia é 16 euros. Dada a grande afluência do restaurante, convém reservar mesa. Poderão fazê-lo através do +351 255 698 773. Está aberto ao almoço e jantar. Encerram ao domingo ao jantar e segunda-feira todo o dia.
– Localização
O restaurante D. Amélia fica localizado na Quinta do Casal – Bairros, 4550-064, Castelo de Paiva.
Onde Dormir na região Serra de Montemuro
Quinta de Novais
Esta quinta do século XVIII foi transformada num pequeno hotel rural, e foi aqui que ficamos alojados na primeira noite. Localizado no vale de Arouca, junto à serra da Freita, a Quinta tem piscina e um belo jardim com castanheiros e carvalhos. É também possível alugar bicicletas para ir conhecer a região. Os quartos são simpáticos e bastante limpos, com um nível de conforto para qualquer viajante.
Os quartos duplos custam a partir de 60€, com pequeno-almoço incluído. Façam aqui a vossa reserva na Quinta de Novais ou cliquem no link para verem mais fotografias e a descrição deste alojamento.
Hotel Porto Antigo
Localizado em pleno Porto Antigo, este é um lugar mágico onde vemos a confluência do rio Douro e do rio Bestança. O hotel é muito confortável e um pequeno refúgio para quem gosta da serra e de estar junto ao rio, com um pouco de luxo. O hotel tem uma piscina exterior, serviço de massagens e da doca do porto partem embarcações diárias para conhecer a região. O restaurante do hotel é também uma ótima surpresa, com uma bela vista sobre o rio. Jantámos por lá quando chegámos e não ficámos nada desiludidos, porque a refeição fugiu ao típico jantar de hotel. Valeu a pena!
Os quartos duplos custam a partir de 86€, com pequeno-almoço incluído. Façam aqui a vossa reserva no Hotel Porto Antigo ou cliquem no link para verem mais fotografias e a descrição deste alojamento.
Excelente ‘desenho’ desta zona! Bom post! 🙂
Obrigada 😀