Porque tambem se aprende nos livros de viagem. E muito:

“O destino desta extraordinaria civilizacao, que ao longo de milenios seguira outro caminho, que enfrentara a vida, a morte, a natureza e os deuses de maneira diferente dos outros, entristecia-me! A civilizacao chinesa inventara a sua forma de escrever, de comer, de fazer amor, de se pentear; era uma civilizacao que durante seculos tratou os seus doentes de modo diferente, que olhou de outra maneira para o ceu, para as montanhas e para os rios; que teve uma ideia diferente sobre a maneira de construir casas, de fazer os templos, outra concepcao de anatomia, um conceito diferente de alma, de forca, de vento, de agua; uma civilizacao que descobriu a polvora e a usou apenas para fazer fogo-de-artificio, em vez de projecteis para canhao. Essa civilizacao hoje procura apenas ser moderna como o ocidente; quer ser como aquela ilhota com ar condicionado que e Singapura; produz jovens que sonham apenas vestir-se como agentes comerciais e fazer fila em frente dos fast food da MacDonald, ter um relogio de quartzo, um televisor a cores e um telefone portatil.

Nao e triste? Nao digo para os chineses, mas para a humanidade em geral, que muito perder ao perder as suas diferencas e ao tornar-se identica. Mao percebera que, para salvar a China, era preciso protege-la da influencia ocidental e leva-la a procurar uma solucao chinesa para o problema da modernizacao e do desenvolvimento. Ao ter em conta este problema, Mao foi grande. E tambem foi grande no erro quanto ao modo de o resolver. Mas sempre grande, Mao: grande poeta, grande estratega, grande intelectual e grande assassino. Mas grande como a China. Assim como agora e grande a sua tragedia.

Se alguem, daqui a uns seculos, for capaz de olhar para tras, para a historia da humanidade, o fim da civilizacao chinesa devera parecer-lhe uma grande perda, pois com ela acabou-se uma grande alternativa cuja existencia, provavelmente, garantia a harmonia do mundo.

Nao por acaso foram os chineses a descobrir que a essencia de tudo e o equilibrio entre os opostos, entre ying e yang, entre o Sol e a Lua, a luz e a sombra, macho e a femea, e agua e o fogo. E na harmonia entre as diferencas que o mundo se sustenta, se reproduz, esta sob tensao, vive. Por isso ha uma certa razao para ter saudades do comunismo, nao enquanto tal, mas enquanto alternativa. contraposicao. Sem ele, criou-se hoje no mundo um desequilibrio, e a propria parte que julga ter vencido sofre agora com essa falta de tensao que afinal estimulava a sua criatividade.”

Tiziano Terzani em Disse-me um Adivinho, 1995

Tiziano Terzani

Chamo-me Diana.Gosto de ler, gosto de escrever e tenho ganho o gosto de viajar. Decidi juntar as historias acumuladas neste espaco e chamei-lhe Contramapa. Porque nas contracapas dos meus livros existe sempre um mapa, um sitio onde ir, um local a descobrir. Aqui podem conhecer as minhas historias e viagens em livro aberto.

7replies
  1. Chronosfer
    Chronosfersays:

    Havia lido materia sobre a destruicao de Palmira quando seu post chegou. Oportuna reflexao sobre a vida e tambem sobre nos e no que acreditamos e no que podemos ainda nos transformar. Meu abraco.

    Responder

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